Decisão inédita em SC afasta cobrança de ITCMD na extinção de usufruto em holding familiar

Sentença garante a segurança jurídica do usufruto como ferramenta de planejamento sucessório e tributário. 

Uma decisão judicial pioneira oriunda de Santa Catarina confirma que a extinção do usufruto sobre quotas ou ações de Holding Familiar não pode ser alvo de cobrança do  Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).  

Além de Santa Catarina, vários Estados do Brasil como São Paulo, Paraná, Distrito Federal e Minas Gerais, apenas para mencionar alguns, cobram o tributo sobre doações na extinção do usufruto, que ocorre, geralmente, com a morte do usufrutuário. A sentença, expedida pela 2ª Vara Cível da Comarca de Joaçaba, impede a cobrança do ITCMD na extinção de usufruto de participações societárias de holding familiar, representando um marco no estado de Santa Catarina e no Brasil, sendo a primeira vez que a Poder Judiciário e Ministério Público reconhecem a não incidência especificamente sobre holdings familiares.

De acordo com os advogados Renato Vieira de Avila, Leonardo Caldieraro e Galileu Broering, do escritório catarinense Vieira de Avila Advocacia, que representa as partes envolvidas, o cerne da decisão reside no fato de que a extinção do usufruto sobre as participações societárias não é vista como um evento econômico passível de ser atingido pelo ITCMD. “O usufruto, no contexto de holdings familiares, é comumente utilizado como uma ferramenta para gestão patrimonial, especialmente no planejamento sucessório. Ao extinguir o usufruto, a propriedade plena do bem se consolida em nome dos herdeiros ou nus proprietários, sem que haja uma nova transferência de titularidade não onerosa que justificasse a cobrança do ITCMD”, explica Renato Vieira de Ávila. 

Segundo o advogado, a importância dessa decisão está em seu caráter inédito, estabelecendo um precedente relevante. “Ela oferece segurança jurídica aos interessados no planejamento sucessório, ou seja, sucessores e sucedidos. Os sucessores pelo alívio na carga tributária; os sucedidos por contarem com o usufruto para exercerem o comando em suas holdings familiares. Muitas vezes, o Fisco tributa essas movimentações como se fossem uma nova transferência de propriedade “, aponta.

Usufruto nas holdings familiares

Com essa decisão, os proprietários de holdings familiares podem ter mais tranquilidade no uso do usufruto como instrumento de planejamento sucessório e tributário. Isto porque, é o usufruto que garante à geração que foi responsável pela construção do patrimônio, a manutenção do comando sobre o legado antecipado em vida para seus herdeiros. 

O usufruto, por definição, permite o uso e o controle do bem doado, no caso, as quotas ou ações da Holding Familiar. E isso faz parte do planejamento sucessório, que, de forma resumida, é a organização da transferência do patrimônio de uma geração para as seguintes, com o objetivo de minimizar o custo financeiro e os conflitos familiares advindos dos procedimentos de inventário.

“Obviamente que, com a incidência do ITCD sobre a instituição ou extinção de usufruto, muitos empresários, a fim de evitar essa cobrança tributária, acabam por utilizar outras ferramentas sucessórias e societárias para conseguir transferir seu patrimônio aos herdeiros”, destaca o advogado. Por mais que as modernas ferramentas sejam úteis e seguras, na opinião do especialista, na maioria dos casos pode implicar em risco ao comando de seu patrimônio.  “Ferramentas com a Golden Share, poison pills, e demais cláusulas do moderno direito societário ainda apresentam deficiências ao serem comparadas ao tradicional usufruto”, explica Vieira de Ávila.   

O usufruto de participações societárias de holdings familiares, é frequentemente utilizado para permitir que a geração mais velha (normalmente os fundadores que tem interesse em administrador a holding) mantenha o controle sobre a administração e os rendimentos da sociedade, podendo, por exemplo, nomear administradores, autorizar a venda dos bens da sociedade, deliberar sobre a distribuição de lucros ou dividendos e etc. Este arranjo possibilita uma sucessão ordenada, com os bens sendo imediatamente transferidos de forma integral aos herdeiros, mas com limitações ao poder de uso e fruição.

Quando o usufruto é extinto, aquele que detém a propriedade, mas não o uso, apenas consolida o pleno direito sobre o bem, sem que ocorra uma transmissão nova de patrimônio que justificaria a cobrança do ITCMD.

Quando o usufruto se extingue, ocorre apenas a consolidação completa do controle e da titularidade do bem para quem já tinha a nua propriedade da participação societária, o que afasta a incidência do ITCMD.

Interpretação da legislação do ITCMD

O ITCMD, conforme definido pela legislação tributária, incide sobre transmissões de patrimônio, seja por herança, seja por doação. No entanto, segundo Renato Vieira de Ávila, o ponto chave da decisão judicial é que a extinção do usufruto configura a consolidação de um direito já existente. “Essa interpretação faz sentido à luz do direito civil, que distingue claramente a propriedade plena da nua-propriedade e do usufruto. Quando o usufruto é extinto, o nu-proprietário não recebe um bem novo, mas apenas atinge a plenitude dos seus direitos sobre a propriedade. Portanto, a cobrança do ITCMD nesse caso seria um afronto à Constituição Federal, o que a Justiça catarinense considerou incorreto”, observa. 

Essa decisão pode incentivar  o uso do usufruto como uma estratégia de sucessão patrimonial em holdings familiares, sem o medo de uma futura tributação pela extinção desse direito.

 

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